Após uma década de estudos, pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e do Laboratório de Fisiologia Ecológica da Universidade de São Paulo (Lafieco/USP) conseguiram aumentar 120% a sacarificação do bagaço da cana-de-açúcar ao longo de 12 meses. A descoberta pode baratear o custo de produção do etanol de segunda geração — combustível obtido através da fermentação e destilação de resíduos vegetais, como o bagaço da cana-de-açúcar.
O estudo, desenvolvido professor do Laboratório de Bioquímica de Plantas da Universidade Estadual de Maringá (Bioplan/UEM), Wanderley Dantas dos Santos, e pelo professor e coordenador do Laboratório de Fisiologia Ecológica da Universidade de São Paulo (Lafieco/USP), Marcos Buckeridge, foi publicado no jornal Biomass and Bioenergy.
A pesquisa selecionou e aplicou compostos naturais com atividades biológicas nas plantas de interesse agrícola, sendo eles o ácido metilenodioxicinâmico (MDCA), ácido piperolínico (PIP) e daidzina (DZN). Esses compostos são inibidores específicos de enzimas envolvidas na síntese da lignina, molécula que confere rigidez à parede celular da planta. Ao alterar o metabolismo da lignina os pesquisadores facilitaram o acesso de enzimas hidrolíticas ao carboidrato da parede celular da planta, como a celulose. Assim, é possível produzir mais açúcares que podem ser fermentados para a produção de etanol.
Financiado pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) do Bioetanol, o projeto recebeu recentemente apoio do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI), sediado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP), e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em parceria com a Shell.
A descoberta que contou com o apoio dos estudantes de doutorado Diego Gonzaga, Victor Hugo Salvador, Denis Freitas, Breno Joia e Dyoni Oliveira bem como os pesquisadores do Bioplan Rodrigo Constantin, Fabiano Rios, Rogério Marchiosi e Osvaldo Ferrarese-Filho (fundador do Bioplan), que também assinam o artigo, poderá aumentar e baratear a produção do etanol de segunda geração. “Nossa ideia é gerar uma cana-de-açúcar mais fácil de sacarificar, ou seja, de extrair os açúcares das celuloses”, disse o coordenador do projeto Bioplan.
Buckeridge explica que a aplicação dos compostos permite um melhor aproveitamento da biomassa da cana-de-açúcar. “Com a modificação na lignina, o bagaço se torna mais fácil de ser digerido pelas enzimas. Ou seja, será necessário utilizar menos enzimas no decorrer do processo. As enzimas correspondem à parte mais cara da produção do etanol de segunda geração”, explica o professor da USP. Atualmente, o bagaço é utilizado para geração de calor e bioeletricidade, mas sua utilização como fonte de açúcares poderia aumentar em até 40% a produção de etanol no país.
Após a tecnologia se patenteada em 2018, duas startups, encabeçadas por estudantes da UEM, surgiram: a Power Growth e a Biosolutions. Santos diz que a ideia agora é elaborar um produto a partir dos compostos.
Agora com recursos do RCGI, o grupo desenvolve um projeto visando testar a eficácia da tecnologia na unidade da Raízen, sediada em Campinas, no estado de São Paulo. O projeto é conduzido pelo professor Wanderley dos Santos que atua como pesquisador visitante na USP.
Através da tecnologia desenvolvida, chamada pelos cientistas de engenharia fisiológica, foi possível também acelerar o crescimento de mudas para arborização urbana, reflorestamentos e recuperação de pastagens degradadas. Outro êxito obtido por eles foi com os aumentos médios de 30% no teor de lignina em caules, folhas, vagens e grãos de soja o que protege as plantas e grãos de estresses biológicos e mecânicos. Esta tecnologia está em fase avançada de desenvolvimento em parceria com a Fortgreen.
“As possibilidades são inúmeras e promissoras. A engenharia fisiológica é uma tecnologia baseada em estratégias utilizadas pelas próprias plantas na natureza. Ela abre todo um novo campo de pesquisa e aplicações que junto com o melhoramento genético e a engenharia genética, apenas começa a mostrar seu potencial para contribuir com avanço da agricultura e da agroindústria no Brasil”, finaliza o professor da UEM.
(Com informações da Assessoria de Imprensa)